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quinta-feira, janeiro 14, 2010

ZILDA ARNS: IMPOSSÍVEL NÃO LAMENTAR TAMANHA PERDA



"Pessoas como a senhora Zilda Arns não morrem jamais, eternizam-se por suas ações. Todo bem que semearam florescerão e seus frutos se incumbirão de perpetuar a sua memória". (Silvana Moreli)

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“Se queremos libertar uma pessoa, temos que dar um instrumento
 de libertação, a alfabetização.” Zilda Arns

Autoridades e entidades lamentam a morte de Zilda Arns

13/01 - 16:34 , atualizada às 18:59 13/01 - iG São Paulo


A médica sanitarista Zilda Arns morreu no terremoto do Haiti nesta terça-feira (12/01/2010). Autoridades e entidades brasileiras lamentaram a morte lembraram os principais feitos da fundadora da Pastoral da Criança.
    Luiz Inácio Lula da Silva, presidente da República: “Transmito meu pesar e minha total solidariedade ao povo haitiano e às famílias das vítimas brasileiras, civis e militares, em especial de Zilda Arns, coordenadora da Pastoral da Criança”.

Celso Amorim, ministro de Relações Exteriores: "O presidente (Lula) estava absolutamente chocado, lamentou muito. (Zilda) é uma pessoa de grande projeção no País. Foi uma grande tragédia. Há vários tipos de preocupações, não apenas com a situação de brasileiros militares e civis mas também com a situação do povo haitiano"
Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente da República:  “Foi ela que mostrou como é possível, com a ajuda do trabalho voluntário, enfrentar os problemas sociais e reduzir o sofrimento dos mais pobres. Conseguimos baixar as taxas de mortalidade infantil não apenas pela ação dos governos, mas pelo devotamento de Zilda e da Pastoral da Criança”.


AE

Zilda Arns, fundadora da Pastoral da Criança
Cardeal d. Paulo Evaristo Arns, arcebispo emérito de São Paulo e irmão de Zilda Arns: “Acabo de ouvir a emocionante notícia de que minha caríssima irmã Zilda Arns Neumann sofreu com o bom povo do Haiti o efeito trágico do terremoto. Que nosso Deus em sua misericórdia acolha no céu aqueles que na terra lutaram pelas crianças e pelos desamparados. Não é hora de perder a esperança. Ela morreu de uma maneira muito bonita, morreu na causa que sempre acreditou"


José Serra, governador de São Paulo: "Zilda Arns era uma mulher extraordinária. Movida pela fé cristã, conhecedora do espírito de solidariedade do nosso povo, simbolizava como ninguém o trabalho da Pastoral da Criança, com mais de 150 mil voluntários espalhados em mais de 3,4 mil municípios do Brasil, nas regiões mais pobres, atuando junto às famílias, às gestantes e às criancinhas. Quando ministro da Saúde, a Pastoral da Criança, e dona Zilda, foram nossos principais parceiros no combate à mortalidade infantil. Logo no início da minha gestão de quatro anos duplicamos os investimentos no trabalho por eles desenvolvido. A forte queda dessa mortalidade deve-se muito à ação da Pastoral. Por isso mesmo, em 2001 coordenei a proposta de outorga do Prêmio Nobel da Paz à dona Zilda, proposta essa que obteve grande apoio em todo o Brasil e no exterior. Como indivíduo, ninguém fez tanto em nosso país pela vida das crianças quanto Zilda Arns. Sua perda é dolorosa para todos nós. Para mim, foi-se uma amiga, muito querida"

José Sarney, presidente do Senado Federal: "Lamento o episódio profundamente. O Brasil perdeu uma de suas mais expressivas figuras. Ela era um exemplo extraordinário de dedicação às crianças, aos pobres e às causas sociais. Era uma referência. Essa não é uma perda só para a família, mas para o Brasil inteiro. Sua morte enluta todo o País."
Michel Temer, presidente da Câmara dos Deputados: “A morte de Zilda Arns deixa milhões de órfãos no Brasil. Não só os integrantes de sua família, mas também os muitos filhos adotados por ela em seu trabalho na Pastoral da Criança e na Pastoral do Idoso. Zilda Arns tornou-se sinônimo de doação em sua luta pelos mais carentes, em seu combate diuturno à mortalidade infantil e na busca pela melhoria da vida do povo.”

Nelson Jobim, ministro da Defesa: "Sob o impacto da tragédia que se abateu sobre o povo do Haiti, presto meu tributo especial aos militares brasileiros que tombaram no cumprimento da missão delegada, antes de tudo, pelo povo brasileiro: levar a solidariedade e o calor da nossa gente aos irmãos haitianos. Eles carregavam em seus corações um pouco do amor e da compaixão semeada por D. Zilda Arns, mulher exemplar que teve sua vida também ceifada neste triste acontecimento. D. Zilda, num sacerdócio que contagiou e mobilizou multidões, tinha em comum com os militares brasileiros da Missão de Paz da ONU, em seus últimos momentos, a voluntariedade na dedicação à tarefa. Ali, ninguém estava obrigado, mas movido pelo interesse no crescimento pessoal, trazido pelas novas experiências e, especialmente, pelo esforço solidário para tornar o mundo melhor e mais seguro para os seus semelhantes. Este é o grande legado que nos deixam esses homens e mulheres sacrificados pela missão no Haiti. E a eles prestamos as nossas homenagens".
Aldo di Cillo Pagotto, arcebispo e presidente do Conselho Diretor da Pastoral da Criança: "É com grande pesar que a Arquidiocese da Paraíba recebe a lamentável notícia da morte da Dra. Zilda Arns Neumann, fundadora da Pastoral da Criança. Ela foi uma das vítimas do terremoto que devastou o Haiti. A nossa querida Zilda continua viva em nossos corações pelo exemplo de mulher sempre preocupada com os mais desassistidos nos grandes bolsões de pobreza do nosso Brasil e também de outros países. O bem-estar das nossas crianças foi a preocupação que regeu a vida dessa batalhadora que chegou a ser indicada ao Prêmio Nobel da Paz. Humanitária, preocupou-se também com o outro extremo da nossa vida terrestre: as pessoas idosas, sendo fundadora da Pastoral que atende a esse público. Dra. Zilda deixa milhares de seguidoras do seu trabalho. São líderes comunitárias espalhadas pelo mundo, que vão de porta em porta, de casa em casa, ensinando às mães noções simples de cuidados com os filhos que possam, em áreas sem condições humanas básicas, garantir a sobrevivência de milhares de meninos e meninas. Ficará guardado na nossa memória, eternamente, aquele sorriso aprazível, de carinho, de conselheira, de mãe. Foi isso que Dra. Zilda foi: uma mãe para todos os brasileiros."
Cezar Britto, presidente do Conselho Federal da OAB: A morte de Zilda Arns, em plena ação missionária, no Haiti, tem a dimensão trágica e poética do artista que morre em cena. Dedicou toda a sua vida de médica sanitarista à causa dos desvalidos. Sacrificou a perspectiva de uma vida regular e confortável, que sua qualificação profissional lhe permitia, ao nobre ideal de submeter-se ao mandamento cristão de amar ao próximo como a si mesmo.Raras são as pessoas desse quilate espiritual, capazes de renúncias desse porte. Zilda Arns inclui-se numa seleta galeria de seres humanos integrais, em que figuram personagens como Madre Teresa de Calcutá e Irmã Dulce.São pessoas que melhoram o mundo e seu tempo e impedem que o ser humano descreia de si mesmo. São beneméritas da humanidade, cuja biografia vale por um tratado de direitos humanos. Fui seu colega no Conselho Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social e tive o privilégio de com ela conviver. Sua morte desfalca os que travam o bom combate, de que falava São Paulo, e enluta não apenas o Brasil, em que era peça-chave no desenvolvimento de políticas sociais, mas toda a América Latina, a que também estendia o manto de sua generosa ação humanitária".
José Gomes Temporão, ministro da Saúde: "A trajetória desta médica catarinense que acolheu como missão de vida a saúde pública é exemplar para todos os brasileiros. A atuação desta grande mulher e grande sanitarista brasileira foi essencial para elevar a criança a uma condição prioritária dentro das políticas públicas brasileiras. Morreu em missão, como viveu toda a sua vida."
Aécio Neves, governador de Minas Gerais: "Na tragédia que atingiu o Haiti, perdemos, todos os brasileiros, uma das nossas mais importantes referências no campo social. E Minas, a sua mais generosa parceira. Os inúmeros exemplos que Doutora Zilda nos deixa - de solidariedade, de responsabilidade compartilhada e amor pelo Brasil - ficarão, no entanto, para sempre. Para nós, significam um verdadeiro legado capaz de iluminar o caminho do País na direção da justiça e equidade."
Gilberto Kassab, prefeito de São Paulo: "Com profundo pesar, lamento a morte de Zilda Arns, dos vários brasileiros e de todas as pessoas que perderam suas vidas na tragédia ocorrida no Haiti. Médica e idealizadora da Pastoral da Criança, Zilda Arns foi uma grande humanista. Dedicou toda a sua vida ao próximo, contribuindo decisivamente para a redução da mortalidade infantil e das desigualdades sociais no Brasil. O seu trabalho e a sua dedicação à causa social, cuja importância lhe rendeu vários títulos internacionais e uma indicação para o Prêmio Nobel da Paz, permanecerão como exemplo para as futuras gerações de brasileiros."
Sérgio Guerra, presidente nacional do PSDB: "Zilda era movida pelo seu imenso amor aos excluídos e dedicou-se a dar melhor qualidade de vida a milhões de crianças no Brasil e no mundo. Sua morte é uma perda imensa para todos aqueles que sonham com um Brasil verdadeiramente mais generoso e solidário."
Patrus Ananias, ministro do Desenvolvimento Social e Combate à Fome: “A morte surpreende sempre mas no caso de Zilda Arns acresce à surpresa um grande sentimento de perda em face do seu trabalho, do seu compromisso com a vida, com a dignidade humana e com os valores éticos. Ela morreu ensinando e cumprindo sua missão.”
Geraldo Martins Dias, padre e assessor da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB): “Ela deixa uma grande lacuna, mas ao mesmo tempo um grande legado que honra a todos nós."
Força Sindical: "A direção da Força Sindical lamenta profundamente a morte da médica e fundadora da Pastoral da Criança Zilda Arns, ocorrida durante o terremoto no Haiti. É uma perda irreparável para toda a sociedade brasileira. O Brasil perdeu um ícone da luta contra a ditadura e uma incansável e exemplar lutadora pelos direitos das crianças e adolescentes. Vale destacar que seu trabalho em prol das causas humanitárias é reconhecido mundialmente.Nosso pesar a família e todas as vítimas deste terrível desastre ocorrido no Haiti."

14/01/2010 12.53.09



ZILDA ARNS, GRANDE MÃE BRASILEIRA


Cidade do Vaticano, 14 jan (RV) - O Livro dos Provérbios em seu capítulo 31 nos traz o elogio da Mulher Talentosa, da mulher que coloca suas aspirações à serviço do bem a todos de sua casa, sejam familiares ou empregados.



O povo brasileiro chora ZILDA ARNS, a mulher talentosa que se destacou nas últimas décadas servindo seus irmãos, certamente os mais desprovidos. Dra. Zilda, uma das Mães do Brasil, morreu, como não poderia deixar de ser, em ação. Para a mulher que vive em plenitude sua vocação, jamais existe tempo de descanso, tempo para si, mas tudo o que possui é colocado em favor de seus amados. Zilda Arns amou até o fim as pequenas vidas e as mulheres pobres que as geraram. Sua formação cristã e sua medicina foram colocadas à serviço da infância carente e da mãe pobre. Sua política era salvar vidas, jamais negar o juramento de Hipócrates e absolutamente trair a profissão de fé em Jesus Cristo, a Vida.

O Menino Jesus a encontrou em Porto Principe onde havia chegado para fazer palestras em favor da vida. Interessante Dra. Zilda morrer logo após as festas de Natal, do nascimento do Deus pequenino, de uma mãe pobre, carente.
Isso dá a essa nossa irmã uma grandiosidade de quem morre em serviço. Sim, Zilda Arns morreu em serviço, a favor da Vida, na plenitude de seus 75 anos, sempre simpática, alegre, bonita!

De modo algum a Dra Zilda transmitiu, ao se entregar ao serviço dos pobres, imagem de pessoa amarga, triste, revoltada, apesar de ver absurdos e de ser solidária a tanta miséria. Sua beleza e alegria eram contagiantes e suscitava um exército de seguidoras e seguidores.

Atualmente, após entregar a coordenação nacional da Pastoral da Criança à Irmã Vera Lúcia Altoé, Dra. Zilda Arns assumiu a Pastoral do Idoso, sempre voltada para aqueles que não têm voz, que são limitados pela idade. Mas o trabalho com a infância e com a mãe carente não foi deixado, já que estava à frente da Pastoral Internacional da Criança.

O Livros do Provérbios diz: “Quem encontrará a mulher talentosa? Vale muito mais que pérolas.” “Vigia o andamento de sua casa e não come o pão da ociosidade.”

Muitas mulheres ajuntaram riquezas, tu, porém, ultrapassas a todas.” “Enganosa é a graça, fugaz a formosura! A mulher que teme o Senhor merece louvor. Dai-lhe o fruto de suas mãos e que suas obras a louvem nas portas da cidade.” Dra. Zilda, essa mulher talentosa, virtuosa de que fala a Bíblia, é você! Hoje o povo brasileiro, cheio de dor, sente-se orgulhoso pela senhora e agradece a Deus por sua vida. Sua missão de mulher cristã, tão bem cumprida, nos faz transformar sua imagem em ícone da brasileira que soube viver cristamente a missão de esposa e de mãe, e do mesmo modo a missão de cidadã. Temos certeza que você, Zilda Arns, ouviu as palavras de Jesus: “Venha bendita de meu Pai, receba por herança o reino preparado para você desde a fundação do mundo. Cada vez que você fez o bem a cada um desses meus irmãos mais pequeninos, a mim você o fez”.
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Papo-Cabeça

ZILDA ARNS

Heroína do século

{janeiro de 2003}

Zilda Arns

Médica pediatra e sanitarista, Zilda Arns Neumann fundou e coordena a Pastoral da Criança, organismo da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, CNBB. Atende mais de 1 milhão e 600 mil crianças e 76 mil gestantes, com ações básicas de saúde, nutrição, educação e cidadania. A primeira experiência, em 1983, desenvolveu-se em Florestópolis, Paraná, onde morriam 127 crianças a cada mil que nasciam. O índice caiu a 28 por mil em um ano. Hoje, o índice é inferior a 13 por mil nas áreas em que a Pastoral da Criança atua. A média nacional é de 34,6 por mil. A entidade serve de modelo para países da África, Ásia e América Latina.
Nascida a 25 de agosto de 1934 em Forquilhinha, Santa Catarina, Zilda é viúva e mãe de cinco filhos. Representa a CNBB no Conselho Nacional de Saúde e é conselheira do Programa Comunidade Solidária. Indicada pelo governo brasileiro ao Prêmio Nobel da Paz em 2001 e 2002, em 2 de dezembro passado Zilda recebeu, em Washington, o título de Heroína do Século, atribuído pela Organização Pan-Americana da Saúde.

Almanaque Brasil: No Brasil existe gente passando fome ou são “problemas locais de subnutrição”?


Zilda Arns: Existem pessoas passando fome: 13% da população é miserável. Fiquei contente de o presidente Lula ter o combate à fome como meta número um. A fome não vem só por falta de comida, vem também pela ignorância, falta de solidariedade humana dentro da família, da comunidade. Oferecer comida não vai erradicar a miséria. O alimento deve vir acompanhado de promoção humana, alfabetização de jovens e adultos, projetos de capacitação para o trabalho, perspectiva de vida.


“A fome não vem só por falta de comida, vem também pela ignorância, falta de solidariedade”.

AB: Trata-se de um grande projeto político.


ZA: Tantos anos de assistencialismo no Nordeste e a pobreza só aumentou. Outro problema é a corrupção. Na doação de cestas básicas vi, muitas vezes, políticos dizendo “arrumei a cesta básica para você”, só para ganhar eleições. Agora, se tiver o cartão eletrônico e a mulher puder tirar o dinheiro e gastar onde quiser, ela eleva sua auto-estima e o sentido de cidadania. Não deve haver casas credenciadas e produtos determinados, porque isso pode gerar corrupção. E se as pessoas beneficiadas quiserem comprar os ovos na vizinha ou o leite do vizinho que tem uma vaquinha? Não podem, têm que gastar na casa credenciada. Isso não eleva a cidadania.

Outro cuidado é que todos os beneficiários sejam os mais pobres. Muitas vezes os selecionados são cabos eleitorais, que falsificam dados.

AB: A senhora fez restrições ao Fome Zero.
ZA:
 Tenho dito que há uma chuva de boas idéias. Projetos muito bons que falta fazer rolar na prática.

“Gostaria de colaborar com o governo Lula na erradicação da fome e da miséria”.

AB: Que perspectivas a senhora vê nessa “chuva de boas idéias”?


ZA: Não me foi oferecido cargo e se me oferecessem não aceitaria. Participaria, sim, com a Pastoral da Criança. Ajudaríamos mais de 3.555 municípios onde temos comunidades. Temos uma legião de 155 mil voluntários. Tenho certeza que vamos nos dar muito bem. O próximo governo naturalmente irá formar pessoas que levem isso para frente. Mas temos que valorizar o que está funcionando bem, como o Bolsa Escola, Bolsa Alimentação, erradicação do trabalho infantil, assistência ao idoso.
Gostaria de colaborar com o governo Lula na erradicação da fome e da miséria.
AB: A senhora tem algum trabalho conjunto com o MST?


ZA: Não temos nenhum convênio com o Movimento dos Sem-Terra. Quando se forma um acampamento, crianças começam a morrer, então chamam a Pastoral da Criança. Vamos até eles, treinamos pessoas para cuidar daquelas crianças.

Fiquei comovida quando fui a Guajará-Mirim, em Rondônia. Uma senhora me abraçava e chorava: “Sou sobrevivente do massacre de Corumbiara. Tinha quatro filhos, três desnutridos. Chegou a Pastoral da Criança, tirou minhas crianças da desnutrição, me ensinou a ler e escrever. Tantas coisas maravilhosas, que me tornei líder da Pastoral da Criança, depois coordenadora comunitária e hoje sou coordenadora paroquial. Só tem mais uma comunidade que ainda não está com a Pastoral da Criança aqui na região. Se Deus quiser, até o fim do ano, ela também vai ter esse benefício.”
Essas coisas que animam: ver o fruto da transformação, e de forma pacífica. A Pastoral da Criança é conhecida por todas as classes sociais e religiões como a Pastoral da esperança e da alegria.

AB: É curioso como a Pastoral da Criança mantém essa estrutura. Qual é o segredo?


ZA: Temos um custo baixo: R$ 1,03 por criança/mês foi o custo do ano passado. Sempre menos de meio dólar. O segredo é ser fiel aos objetivos. Economizar ao máximo, treinar e investir em capacitação; gastamos 90% dos recursos em pessoal. Alfabetização também. Uma pessoa pobre, sem saber ler e escrever, fica dependente dos outros. Se queremos libertá-la, temos que dar um instrumento de libertação, a alfabetização. Nada é mais includente do que a informação.

AB: Como isso é estruturado?
ZA: Comecei sozinha. Depois, datilógrafa, secretária, contador, hoje somos cerca de 40 pessoas. Temos estrutura nacional, elaboramos materiais educativos testados nas diferentes regiões. Às vezes a terminologia significa outra coisa em outra região. A gente tem que fazer que seja inteligível para todos. Temos um grupo estadual. A sede administrativa mais forte da Pastoral da Criança são as dioceses, microrregiões. Captamos verbas e mandamos em dinheiro, para chegar até as comunidades. Elas nos prestam contas e nós prestamos conta aos doadores. Temos o nível nacional, estadual, microrregional, e temos a paróquia que é a sede administrativa mais baixa da Igreja. Apesar de sermos ecumênicos, a administração é da Igreja Católica, que no Brasil são 80% católicos ou mais. Nas comunidades temos os líderes. Nós multiplicamos multiplicadores, esses multiplicam outros que chegam até as bases.
Temos um excelente sistema de informação. Em 1987, informatizamos.
AB: Tem limite operacional?


ZA: Atualmente estamos atendendo 19% das crianças pobres. Para duplicar, precisamos de mais dinheiro. Trabalhamos com poucos recursos. Ensinamos só o que é simples, não trabalhamos com coisas complicadas, porque são caras e beneficiam poucos. Queremos coisas simples que beneficiem em massa e que salvem muitas crianças.

AB: Quais os próximos passos?


ZA: Queremos aprofundar em municípios de menor índice de desenvolvimento humano. Queremos erradicar o analfabetismo pelo menos nas líderes. Ainda há muitas analfabetas. Cerca de 17%.


“Muitas líderes são miseráveis, analfabetas, mas com o coração enorme e sedentas por aprender mais”.


AB: Como a Pastoral da Criança vê a questão do planejamento familiar?

ZA: À medida que educamos nossas mulheres, elas tomam consciência e escolhem o método que acham mais adequado. O melhor método é a educação e a suprema lei é a consciência do casal. A Pastoral da Criança respeita a consciência do casal e passa a informação.

Fui à Guiné Bissau e fiquei emocionada ao visitar seis comunidades muçulmanas com a Pastoral da Criança. Também fomos premiados por judeus, luteranos, metodistas, batistas, ortodoxos. Temos o apoio de todas as religiões, todos os partidos e todas as classes sociais. A maior colaboração, inclusive em dinheiro, tirando o governo, vem dos pobres. Temos campanha de doações pela conta de luz no Paraná, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul, Bahia e Alagoas. De cada cem doações, 90 ou mais são abaixo de 1 real. Temos o Criança Esperança, da Rede Globo, maior financiador não-governamental. Temos a Tim Celular que ajuda cerca de 900 alunos de alfabetização por mês. Temos entidades que fazem as colheres de soro caseiro para medir sal e açúcar. Temos o HSBC e outros colaboradores.


“Sempre imaginei o dia em que cada mãe soubesse cuidar de seu filho. Seria uma beleza”.

AB: O soro caseiro parecia tão óbvio, por que nenhum governo pensou nisso?


ZA: Sou pediatra e sanitarista com muita vivência na área de saúde pública. O que mais vi é a ignorância das mães. Trocam o leite de peito pela mamadeira. Como pediatra, gastava mais da metade das consultas educando as mães.

Sempre imaginei o dia em que cada mãe soubesse cuidar de seu filho. Seria uma beleza. Uma rede de solidariedade humana para incentivá-la, para motivá-la, para que ela, o pai, a família cuidem realmente da criança. Quando surgiu a oportunidade de trabalhar com a Igreja, minha intenção era chegar no coração de cada mãe. Porque elas estão desmotivadas com o marido que as maltratou, com o pagamento do aluguel atrasado. Então, não cuidam das crianças. Estão cheias de espinhos.
Imaginei uma rede de solidariedade feita com pessoas da comunidade, em que cada líder tivesse o compromisso de passar tudo para as mães. Ensiná-las a olhar para a criança com uma educação continuada. Queria que as líderes visitassem as mães todos os meses; que pesassem cada criança pertinho da casa delas; que as mães celebrassem a vida no dia do peso; que levassem suas crianças para brincar; que pudessem aprender mais. Um dia de lazer e felicidade também para as mães.

AB: O método trabalha nas duas frentes, prevenção e tratamento?


ZA: Tem dia certo. Damos fitoterapia, multimistura e uma porção de outras coisas para incentivá-las a não comprar medicamentos. Às vezes, gastam metade do dinheiro na compra de medicamentos sem receita. Ensinamos também reconhecer sinais que indicam que devem procurar o médico.

AB: Como as líderes entram na Pastoral da Criança?


ZA: Elas são identificadas na comunidade. Geralmente tem uma pessoa ou duas bem conhecidas. Explicamos o que é a Pastoral da Criança e elas passam a fazer visitas. Depois são chamadas para uma reunião, onde são explicadas as causas das doenças e como a Pastoral da Criança pode ajudar. Quem aceita trabalhar como voluntária passa por uma capacitação inicial de pelo menos 40 horas. Depois, a cada dois meses, recebe um jornal e ouve programas semanais de rádio que dão reforço educativo. Fazemos encontros de trocas de experiências.



“O pagamento do pobre não é só dinheiro. Na hora que ele aprende mais, sente aquilo como pagamento”.

AB: Trabalho de formiguinha.
ZA:
 Primeiro deve-se ter uma política bem definida: o que nós queremos? Porque às vezes as pessoas querem uma coisa, mas daqui a pouco já vira outra e não acontece nada. Nossa meta é reduzir a mortalidade, a desnutrição e a violência. Fazemos uma porção de coisas, mas todas para esse objetivo.
Trabalhamos com as líderes comunitárias como agentes de transformação social. Investimos na líder que mora no ponto de miséria e de pobreza. Muitas são miseráveis, sem dente, sem emprego, analfabetas, mas com o coração enorme e sedentas por aprender mais. E 91% são mulheres e pobres. O pagamento do pobre não é só dinheiro, é também o saber. Na hora que você promove, que ele aprende mais, sente aquilo como pagamento. Também a solidariedade fortalece o tecido social. São ações simples e facilmente replicáveis. Uma líder bem preparada leva, pelo menos, dois anos para aprender. Temos que ter paciência.

AB: E o título de Heroína do Século?
ZA: É a primeira vez que alguém recebe. Eles estudaram heróis do século e tive a graça e a honra - que quero transferir a todas as pessoas que trabalham comigo e sempre me ajudaram. Sempre trabalhei com amor e quero me aperfeiçoar para acertar cada vez mais. Me sinto muito feliz e emocionada. É o prêmio máximo que uma profissional poderia pensar um dia em receber.

Luiz Henrique Gurgel e Mariana Proença
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Fonte: http://www.almanaquebrasil.com.br/papo-cabeca/heroina-do-seculo/

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